No Burkina Faso, a resistência aos antimicrobianos é uma "ameaça que as comunidades não percebem " 

No Burkina Faso, a resistência aos antimicrobianos é uma "ameaça que as comunidades não percebem " 

Ouagadougou – No Burkina Faso, o “O Observatório para a Qualidade e Segurança dos Cuidados” uma organização não-governamental, tem como objetivo monitorizar as ameaças à segurança dos cuidados de saúde, incluindo o problema da resistência aos antimicrobianos (RAM). Através das suas abordagens, baseadas na defesa, comunicação e sensibilização, a organização procura estimular a consciência dos tomadores de decisão e das comunidades. O Dr. Zakaria Gansane, epidemiologista e presidente do Observatório, explica-nos porque é que a RAM é um problema de saúde pública sério.

Quais são os principais factores que contribuem para a resistência aos antimicrobianos no Burkina Faso ?

É um fenómeno natural em que os micróbios são suscetíveis a desenvolver esta resistência ao longo da sua vida . No entanto, alguns factores podem acelerar este processo. O uso irracional ou excessivo de antimicrobianos são os principais factores nos sectores da saúde humana e animal.

No sector agrícola, os antibióticos são usados como factores de crescimento. Para quem está neste sector, os antibióticos ajudam a otimizar o lucro económico. Portanto, há uma utilização generalizada de antibióticos, o que é uma questão delicada no contexto desta luta.

Além destes factores importantes, existem cofactores que desempenham um papel significativo no aparecimento e propagação desta resistência. A título de exemplo, no que diz respeito aos sistemas de saúde, podemos citar a má qualidade dos serviços de " água, higiene e saneamento " no ambiente hospitalar. Isto incentiva a propagação de germes multirresistentes no ambiente hospitalar e a sua transmissão aos pacientes. Isto pode resultar na utilização dispendiosa de antibióticos porque os germes multirresistentes são mais difíceis de tratar. Há também a questão da venda ilegal de antibióticos nas ruas ou nas farmácias.

Os cofactores da resistência incluem o problema da presença de resíduos de antibióticos nos alimentos e até no meio ambiente. Estes alimentos que contêm resíduos de antibióticos podem ser posteriormente consumidos pelas populações (humanos e animais).  Esta situação expõe as bactérias comensais nestes organismos aos resíduos de antibióticos e pode favorecer o aparecimento desta resistência.

O que é que o Observatório está a fazer para lidar com este problema de saúde pública ?

A RAM é uma ameaça global que contribui substancialmente para uma mortalidade significativa e para consequências económicas desastrosas. Em suma, a RAM é uma ameaça que não é percebida pelas comunidades, em parte porque não temos dados suficientes e porque a comunicação sobre o assunto é escassa. Portanto, estamos a trabalhar para ajudar na recolha de informação. Isto é muito importante, pois a defesa, a comunicação e a sensibilização devem ser apoiadas por factos convincentes.

Como representante da sociedade civil, também participamos no desenvolvimento e na adoção do quadro jurídico para o estabelecimento do Comité Técnico Nacional de RAM e também já conduzimos diversos debates sobre o assunto.

Em 2019, juntamente com os parceiros estratégicos nesta luta, como a OMS, a FAO, o Laboratório Nacional de Referência de RAM, realizamos a Semana Mundial de Sensibilização aos Antibióticos para alertar as autoridades nacionais e o público para o problema da RAM. Disponibilizamos comunicação digital contínua sobre o assunto através das nossas redes sociais, que pode chegar a mais de 50.000 pessoas.

Por fim, estamos a tentar assegurar que o debate sobre a RAM não seja exclusivamente para especialistas. Este debate deve ser considerado no contexto da democracia sanitária. Precisamos de assegurar que as comunidades assumem este problema, tal como fizeram com o HIV, a malária, etc.

Quais são os vossos maiores sucessos ?

Temos sido bem-sucedidos a vários níveis. Como colaboradores da sociedade civil, estabelecemos parcerias estratégicas com organizações nacionais e internacionais que trabalham diretamente com o problema da RAM. Isto permite-nos partilhar a visão da sociedade civil sobre o tema, para focar melhor a luta.

Em parceria com outras estruturas do Estado, foi possível participar na preparação de inúmeros documentos normativos em consonância com os setores relacionados, tal como o programa WASH (do inglês Water, Sanitation and Hygiene - Água, Saneamento e Higiene ) em estabelecimentos de saúde.

Além disso, em 2018, realizamos um estudo sobre infeções associadas ao atendimento em três hospitais e isto permitiu-nos prever as consequências da RAM em Burkina Faso, mais especificamente a questão das infeções multirresistentes. Algo que nos deixa felizes é a existência da nossa plataforma social, através da qual fornecemos comunicação digital contínua sobre o tema da RAM.

Por fim, estamos a tentar organizar a luta entre a sociedade civil em Burkina Faso. Um grupo de especialistas em jornalismo e comunicação foi identificado para este fim. Também contactamos organizações voluntárias envolvidas com a saúde animal e o meio ambiente. É fundamental que estas organizações se juntem à luta. Em breve, estas organizações irão beneficiar de um programa de capacitação para que estejam melhor equipadas em termos de RAM. Em última instância, juntamente com estas organizações, queremos definir o quadro de intervenção nacional das organizações da sociedade civil contra a RAM. Em parceria com as organizações governamentais, isto irá permitir-nos criar uma estrutura mais dinâmica para lutar contra este flagelo.

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